À tardinha, luscofusco regressavam os moirais com os seus enormes rebanhos a preder de vista.!
Metiam-nos nas grandes cercas, com a ajuda dos seus cães rafeiros e ao som de um linguajar que só eles , os cães e os rebanhos entendiam, lá se amalhavam as ovelhas .
Regressavam a casa e acompanhados dos rafeiros chegavam-se à lareira e comiam os jantares de grão ou feijão com couves e a bela carne de porco da matança de alguns dias atràs. ( os rafeiros contentavam-se com algumas sobras e uns bocados de pão de farelo que as donas preparavam de semana a semana para eles)
Mas o serão de 5 de Janeiro tinha na minha meninice um encanto especial! Esses ditos pastores e outos vizinhos( mulheres também) reuniam-se em grupos e de porta em porta, alumiados pelo lampião a petrólio , quando não calhava haver um belo luar de janeiro, iam cantar as janeiras! Cantigas , que surgiam expontâneas, fruto das tradições e da inspiração de cada um mas ,com vozes timbradas, aquecidas préviamente com um copinho de medronho ou de aguardente de figo antes de saírem de casa. Lembro-me pouco das letras, mas há uma frase que achava graça e quase sempre anunciava a chegada dos janeireiros: depois de baterem à porta, e sabendo que nessa família havia um luto recente, perguntavam: quer que cante ou quer que reze? Consoante a resposta rezavam ou cantavam, mas nos restantes casos as cantigas eram divertidas e quase sempre começavam: Estou aqui vizinha Maria , com o cu na pedra fria .....abra a porta ou o postigo.... Eu e os meus irmãos, entravamos numa excitação misto de medo e de alegria ao ouvirmos o rasmalhar das botas dos janeireiros e dos gatos em corrida à frente dos cães . Eram eles, os janeireiros que se aproximavam da nossa porta. Ouviamo-los e depois sim é que iamos dormir. Tinha encanto a nossa meninice!
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